Está quase, quase a acabar, mas hoje tivemos um dia de sorna graças aos nossos (agora) amigos espanhóis...
Por isso achei muito bem que Maria Cavaco Silva oferecesse "Bolo raínha" à Sra dona Sofia de Espanha.
Também devemos alguns agradecimentos a este senhor,
que afinal foi quem esteve no cerne da coisa.
1 de dezembro de 2009
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7 comentários:
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Não tá ma lvisto.
Como as vedetas que ao receber um prémio agradecem aos paizinhos, avós, a família em peso.
Realmente sem a Restauração não havia feriado. E sem os Filipes não havia Restauração. :)
Não foi mau. Mas se tem calhado à segunda-feira!...
lol
Faltou o "Bolo de S. João" ;)
:)
A Torre de Belém mal se vislumbrava, por entre o nevoeiro cerrado que, apesar do adiantado da manhã, teimava em não levantar. A Praça do Império, ali ao lado, transformada por aquele cinzento húmido e pegajoso, lembrava um campo deserto, aqui e ali semeado de árvores verde escuro, sem turistas, lisboetas ou velhos do restelo. Do outro lado, até o render da guarda, junto do palácio presidencial, soava mais silencioso que o habitual, como se o nevoeiro até conseguisse absorver o marchar vaidoso dos guardas, reluzentes nos seus uniformes de gala.
A limusine branca deslizou suavemente e imobilizou-se em frente ao palácio.
Os transeuntes, espantados com o insólito veículo, apontavam com o dedo – lá vai mais um excêntrico – e os dois guardas do palácio, apanhados desprevenidos junto à entrada de armas, não sabiam muito bem o que fazer.
A enorme viatura branca imobilizara-se defronte da entrada principal do Palácio de Belém e não dava mostras de se querer retirar.
O motorista, uma figura corpulenta e com ar de poucos amigos, emproou-se na sua farda azul escura, contornou a traseira da limusine e foi abrir, com uma solenidade bem treinada, a porta traseira.
Para espanto dos que já se empurravam à beira da entrada do palácio, tentando descobrir qual a celebridade que se fazia anunciar de forma tão triunfal, saiu do interior da viatura um moço jovem, pouco mais que adolescente, com uma curta cabeleira arruivada, uma bengala branca e uma indumentária que a todos fez lembrar os livros de História – muitos folhos, rendados e uma calças tão justas que homem algum hoje em dia se atreveria a usar.
Os dois guardas do palácio, boquiabertos, não sabiam se haviam de rir, chamar reforços ou dispersar a multidão. Cruzaram as armas para barrar a passagem e um deles soprou estridentemente o apito dourado da farda ( seria a primeira vez que o usava, em toda a sua carreira ).
O recem-chegado olhou com altivez em seu redor, sentindo-se objecto de todas as atenções. Ao mesmo tempo, um oficial da guarda do palácio chegava-se à porta, já exaltado pelo número de curiosos que atolavam por completo o acesso ao palácio.
- O sr. não pode estacionar, nem sequer parar aqui.
O motorista interpôs-se entre o oficial e o recem-chegado. Era bastante mais alto e volumoso e o oficial necessitou de levantar bastante o queixo para o conseguir medir de alto a baixo. Os dois guardas de plantão, um pouco atrapalhados, enpunharam as suas armas e colocaram-se por detrás do seu oficial, conforme mandavam as regras.
- Venho visitar o senhor da casa… - anunciou o recém-chegado, num tom sereno – Se pudesse ter a amabilidade de me anunciar…
O oficial da guarda esboçou uma ordem, e logo um dos subordinados correu para o interior da casa da guarda. O outro retomou a sua posição de vigia, ao mesmo tempo que ia empurrando educadamente a pequena multidão de curiosos, tentando manter um espaço vazio em redor do oficial e do estranho visitante.
- E o senhor, - O tom de voz do oficial endureceu subitamente, ao dirigir-se ao motorista da limusina - retire imediatamente esta viatura daqui.
O motorista trocou um leve olhar com o seu passageiro e de pronto, apressou-se a entrar na limusina e a retirá-la da entrada do palácio.
- Deve ser a filmagem de um episódio da novela – dizia uma senhora para a amiga – eles costumam muito filmar aqui por estas bandas…
O visitante continuava imóvel, apoiado na sua bengala branca, a dois passos do portão. Teria vinte e poucos anos e uma aparência fidalga, altiva e distante. Percebia-se que não estava habituado a ser observado assim tão de perto, e isso incomodava-o. Olhava em seu redor com um ar benevolente, mas impaciente.
(continua... )
- A entrada dos visitantes é ali ao fundo – e ia apontando para uma porta envidraçada, a poucos metros dali – e tem que deixar uma identificação. Com quem pretende falar ?
O visitante ignorou a observação e continuou a observar, com curiosidade crescente, tudo o que o rodeava.
Lembrava-se do local, mas como tudo estava tão diferente… à excepção do rio, que ainda corria em direcção ao mar, talvez agora uma pouco escuro…
- Meu caro senhor, não lhe posso responder ao que me pergunta, porque na verdade eu fui chamado, chamaram-me aqui a este local… e como tal, não sei bem a quem me deverei dirigir… - e ia ajeitando os folhos do colarinho.
- E quem o chamou ? – quis saber o oficial da guarda – Na convocatória, deverá indicar a secção ou o departamento que o convocou…
O jovem visitante sorriu, expressando pela primeira vez alguma simpatia.
- Tem razão, tem toda a razão…. – e esticou o braço, apontando para a multidão de curiosos em volta – Na verdade, foram todos eles que me chamaram… - e após uma leve pausa, apontou o dedo ao próprio oficial – na verdade, creio… não, tenho mesmo a certeza que o senhor também foi um dos que me convocou…
O oficial deu consigo a pensar que, provavelmente, estaria a dar importância em excesso ao assunto. Já vira maluquinhos em quantidade suficiente para os conseguir reconhecer, ou pelo menos reconhecer uma conversa como aquela, que não tinha sentido nenhum. Mas, ao mesmo tempo, também era verdade que nunca se lhe tinham apresentado numa limusina branca, a parar com arrogência defronte da entrada principal do palácio de Belém.
- O sr. vai desculpar-me – e o oficial tentou o seu tom mais polido – mas terá que se dirigir aquela porta – e voltou a apontar de novo para a porta envidraçada - ... só ali poderá ser atendido...
O estranho visitante fixou-o nos olhos.
- O senhor já pagou a prestação da sua casa, este mês ?
O oficial ficou boquiaberto.
- Ora essa, o que é que você tem a ver com isso ? Faça favor, dirija-se ...
- E já conseguiu arranjar maneira de pagar o aparelho dos dentes da sua filha ? – continuou o estranho.
O oficial da guarda imobilizou-se.
(continua...)
- O senhor conhece-me, por acaso, de algum lado ? – e aproximou-se, sem qualquer sorriso, ao estranho visitante.
Este ignorou a ameaça e olhando em redor, apontou para uma senhora, já de certa idade, com um lenço azul a cobrir-lhe parcialmente a cabeça.
- E a senhora, já conseguiu pagar os medicamentos, aqueles que comprou ontem na farmácia ?
A visada apontou para ela própria, engasgada. Não teve tempo para responder.
- O senhor ali... sim, o senhor ... – e apontava agora para um tranquilo espectador, que de telemóvel em punho, ia fotografando ou filmando toda aquela agitação – Será que é mesmo hoje que vai conseguir novamente um emprego ?
O espectador tranquilo guardou apressadamente o telemóvel e num ápice, deu meia volta e dapareceu, por entre a multidão.
- E você ? - o estranho aproximava-se agora do outro guarda, que continuava a manter a multidão de curiosos a uma distância segura – Já recebeu a resposta para o seu pedido de transferência ?
O guarda empalideceu, enquanto olhava atrapalhado para o oficial de dia.
Um burburinho manso começou a alastrar por entre os presentes. Quem era aquela personagem, vestida de um modo tão espalhafatoso, com um sotaque tão estranho, que os interpelava com questões que, aparentemente, só os próprios conheciam ?
O motorista da limusina voltava, em passo rápido, após estacionar o veículo.
- Eu sou aquele que vocês estão sempre a chamar... – O estranho levantou a voz, para que todos pudessem ouvir - ... quando mais precisam...
A multidão aproximou-se mais, apertando o círculo em torno da entrada do palácio.
- Quem és tu ? – começava a ouvir-se, por entre os curiosos - És algum político ? – perguntavam outros – De certeza que é um actor de cinema – insistiam ainda outros.
- Meu Senhor... estou de volta – e o motorista fez uma vénia, ao colocar-se diante do seu passageiro. Precisa de alguma coisa ?
O estranho acenou que não, que não precisava de nada, que ficasse tranquilo.
- Quem é ele ? Quem é o teu passageiro ? – insistiam os transeuntes curiosos, rodeando agora também o motorista da limusina.
No mesmo instante, saíam do interior do palácio alguns guardas, alertados pelo ruido e pela agitação no portão.
- Ah, bem vejo... já anunciaram a minha presença ao senhor da casa – exclamou o visitante, ao dar conta da aproximação dos guardas. – Muito bem, muito bem...
O oficial da guarda, mais tranquilo pela presença reforçada dos companheiros, empinou-se no bico dos pés, esticou a farda e decidiu participar na encenação, antes de ordenar aos subordinados que expulsassem a “personna non grata” dali para fora...
- Com certeza, com certeza, ainda não anunciámos ... mas vamos já fazê-lo agora mesmo... e diga-me, quem é que deveremos ter o prazer de anunciar ?
Silêncio geral.
O motorista da limusina chegou-se um pouco mais è frente, e num tom estranhamente solene, afirmou.
- O senhor, por favor, tenha a delicadeza de informar o senhor da casa que sua Alteza Real, o Desejado, El Rei Dom Sebastião I ,Rei de Portugal, de Aquém e Além-Mares, das Ilhas e dos Algarves... respondendo ao chamamento do seu povo, que sofre... voltou.
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